Metafísica do Absurdo
21.6.05
  MISTAGOGIA I

Alguém perguntou a Antão: "O que devo fazer para agradar a Deus?" O ancião replicou: "Preste atenção àquilo que lhe recomendo: onde quer que vás, sempre tenha Deus ante teus olhos; o que quer que faças, faze-o de acordo com o testemunho das Escrituras." (Vida de S. Antão. 3)
.


A resposta de Santo Antão, que faz uso do Salmo 16 (15), é de tal força, que ultrapassa o peso da própria pergunta e carrega-nos vertiginosamente para dentro do Mistério divino. Ela contém em si a Graça que nos veio trazer Deus, no ápice de sua Revelação e assim, a Trindade toda inteira se faz sentir.

Vejamos o que nos exorta o anacoreta, nas palavras do salmista:

"Tenho sempre o Senhor ante meus olhos,
Pois se O tenho ao meu lado não vacilo"


Ora, ter o Senhor sempre ante os olhos é contemplá-Lo a todo momento. É sobretudo experienciá-Lo a cada instante compartilhando a nossa experiência existencial com Ele e, aqui, começamos a entender o quanto tal experiência nos poderia ser terrível: Não somos dignos de ver a Deus, eis a verdade; Ele é o totalmente Outro, oculto, velado, onipotente, aquele que ninguém vê. Nem mesmo Moisés, no Horeb ousou erguer seus olhos para a sarça que ardia sem consumir-se, tanto mais ter seu rosto voltado para Ele todo o tempo! Seria então apenas uma vivência de humilhação e angústia que nos propõe o salmista?

Não. Eis a novidade que o salmista já anuncia: este Deus que nos ultrapassa totalmente quer ser encarado por nós de tal modo, que assumindo nossa condição em seu traço mais distintivo - a morte -, como nos diz Isaías elevou-se para que fosse visto por todos. A encarnação do Filho Unigênito pelo Espírito Santo é a realização da possibilidade de que Deus seja alguém com quem se pode travar conhecimento, o mais perfeito possível. Compreende-se então facilmente o que São Paulo quer nos dizer quando radicaliza a grande verdade evangélica: Ninguém vê a Deus - e portanto ninguém vai a Deus -, senão pelo Cristo, face visível do Deus invisível.

Ter, portanto, os olhos sempre no Senhor, ter os olhos fitos nos olhos do Cristo, é travar com Ele uma relação de intimidade profunda, ao enxergar-se Nele, como que refletido em seus olhos e ver-se em Seus pensamentos. O Deus temível, o Senhor dos Exércitos, desvela-se no amor do Cristo Bom Pastor que se coloca ao nosso lado para que não vacilemos. A resposta de Santo Antão atinge o cerne, não só da pergunta, mas de toda a estrutura da criação e, de forma mais sublime, do Homem: agradar a Deus é conhecer intimamente a Deus, Uno e Trino, de uma maneira definitiva e absoluta, com só Ele poderia nos proporcionar.

U.I.O.G.D.

G.





 
«Il n’y a pas d’amour de vivre sans désespoir de vivre.» Albert Camus, L'Envers et l'Endroit

Presentes Primordiais
novembro 2004 / dezembro 2004 / janeiro 2005 / fevereiro 2005 / março 2005 / abril 2005 / maio 2005 / junho 2005 / julho 2005 / agosto 2005 / setembro 2005 / outubro 2005 / novembro 2005 / janeiro 2006 / fevereiro 2006 / março 2007 / maio 2007 /


Para ser informado sobre atualizações, preencha com seu email

powered by Bloglet

Blogs

cabeza marginal
criptestesia
da estrangeiridade
eccehomo
et alors
guardando rebanhos
litteraefflch
papel de pão
pensar enlouquece, pense nisso
superfície reflexiva
walkwoman
wumanity

Links

anpof
artcyclopedia
classic resources
epistemelinks
faculdade de filosofia são bento
hopper
instituto hypnos
le web camus
manybooks
mit classic archive
wordtheque



Powered by Blogger

xml



Divulgue o seu blog!